terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Minha vida na Bahia - Parte I.

Algum tempo após a morte de meu pai e minha avó, a vida aqui no Rio se tornou praticamente impossível. Era 1974 e a pensão do meu pai iria demorar pelos prognósticos mais otimistas, pelo menos um ano, para ser liberada. Minha mãe não tinha com quem me deixar para ela poder trabalhar. As contas se acumulavam. O aluguel atrasado. Os armários de mantimentos vazios. Ainda bem que mamãe não tinha geladeira. Nem dinheiro para comprar passagens para a casa da mãe de meu pai, na Bahia, nós tínhamos. Nós é modo de falar, com apenas dois anos de idade, eu certamente estava alheia a todos esses problemas. Não me lembro de nada, a não ser das paredes de nossa casa, do nosso sofá, do meu urso laranja e algumas poucas coisas. Meu tio Adenil, irmão do meu pai veio de Ilhéus para nos buscar. Mamãe conta que ele era gente boa, tranquilão e hippie, usava calça jeans de boca sino, cabelo sem pentear e uma corrente no pescoço. E lá fomos nós em busca de nem sei o quê, retirantes ao contrário, saíndo do sudeste rumo à Bahia. Mamãe vendeu praticamente tudo o que havia na casa. Só levava roupas e a televisão comprada à prestação por meu pai.
Não consigo, é impossível pensar nisso sem sentir a solidão infinita de minha mãe. Sem vê-la olhando para os lados, sem mãe, sem marido, sem emprego, sem chão. Se fechar os olhos consigo imaginá-la à noite, chorando, o coração apertado.
Na Bahia fomos morar na casa de minha avó. Lá moravam muitas outras pessoas. Meus tios e tias, e alguns primos. Era uma casa grande, muito simples e cheia de gente. Conheci minha bisavó. Uma senhora já bastante idosa, sempre deitadinha em sua cama onde nós lhe pediamos bênção. Conheci tantos outros tios e primos, pois a familia de meu pai é enorme. Conheci uma tia de papai que chamamos Litinha, ou simplesmente "mãe-tia" por ter cuidado de seus sobrinhos com se fosse mãe destes. Lembro vagamente de sua casa. Ficava à beira de um rio chamado "Rio Cachoeira" e atravessava a cidade de Itabuna. Tenho algumas fotos que tirei na margem desse Rio. Mamãe fala que minha prima Lana fazia xixi no chão e o xixi ficava por lá, até secar naturalmente. Certamente isso deve ter aterrorizado minha mãe que tem uma noção de cuidado com a casa muito forte.
Tenho poucas lembranças desse período. Ficamos por lá aproximadamente um ano. Mamãe não se acostumou a casa de minha avó baiana, uma casa cheia, confusa, sem espaço para nós, tão diferente da casa de minha avó italiana, sua mãe e sua maior referência, assim como ela é a minha.

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